Após retornar de viagem, mais uma muda me chegou, primeiro lida ao telefone, para depois me vir às mãos. A voz quase entalou ao escutá-la, mas era também aniversário do autor e urgia eu terminar os parabéns para depois pensar no choro. Mais uma vez, arrisco-me a publicá-la sem autorização, pois tenho aprendido que emoção boa deve ser compartilhada. Aqui está, então, um dos acontecimentos que muita felicidade me deu nos útimos dias: a comemoração dos setenta anos de minha mãe, cuja oportunidade reforçou a gratidão pelo meu avô(meu avohai) - velho lunduzento muito amado, pela minha avó - mão amorosa, cuja semente cheira a jasmim - enfim, por todos os seus rebentos.
A emoção foi tamanha que me calou os dedos, daí tomar emprestado os do meu irmão (dizem que é primo) para explicar meu silêncio. Como ele já me disse que Sementeiras é também minha sala de visita, tomo esta liberdade. Obrigada, cumpade. Talvez, nos próximos dias, eu publique algumas linhas que saíram a pulso sobre o Ludovico - meu pé de serra mais caro.
PRESENTE DE ANIVERSÁRIO
Festa de aniversario era confraternização, era uma celebração pelos frutos de uma semente saída da violência da Aurora, desbravou a Amazônia e os seus seringais, desceu rio abaixo numa canoa e descansou num chalé às margens do rio salgado, terminando por se firmar no solo fértil da antiga ilha dos macacos, que em homenagem a um aristocrata passou a ser Ludovico.
Festa, reunião de gente que se gosta, mesmo que às vezes esqueça disso, junta com coisas como o velho jasmim-laranja - irmão também - e aqueles bancos antigos de momentos tristes e alegres, cúmplices das nossas conversas. E o alpendre velho como sempre nos abrigando, nos abraçando com as suas lembranças de todos e de tudo. Não tínhamos alguns que poderiam responder “presente”, mas acho que sorriam chorando, assim como os seus.
Eita, meu querido, meu amado velho lunduzento, nem o conheci fisicamente, mas sinto a sua herança dentro do meu peito, o amor pelos nossos. E o apreço pela sua retidão moral, indiscutível caráter, afeito ao trabalho e ao cuidado com a família. Nunca o vi com os braços cruzados para trás, temperando a garganta com a fronte franzida, nos dias de destempero, mas até tal sabor provei sem conhecê-lo, pois o trago comigo.
Os seus rebentos já passaram dos sessenta, setenta e outros dos oitenta, mas continuam sendo o Ciço Camaleâo, o Oi de Cobra Morta, a Oi de Pitomba Lambida, a Galinha Carijó, o Quebra queixo, a Maria Pimenta, o Venta de Bezerro Novo, o Zé Coquin, o Malota, todos, embora distantes, por vezes, ao aproximarem-se demonstram todo amor que sempre os uniu, principalmente nas dificuldades. São todos crianças crescidas cercadas por suas proles.
Não tenho palavras para expressar a alegria de fazer parte desta saga, mas despertado pela iniciativa de dois brilhantes irmãos de berço e coração, sendo primos de sangue, sei da necessidade de celebrarmos sempre a nossa história, a nossa união, o nosso amor por nós mesmos. E deixarmos a carcaça da ignorância, as farpas dos conflitos e o egocentrismo de lado. É tempo de oxigenar as relações desses rebentos, para que possam envelhecer com o mesmo sentimento que cresceram.
Halano