segunda-feira, 29 de agosto de 2011

PEDREIRA

As luzes sagradas de Recife me esperam. Gente dorme lá embaixo, enquanto exulto em chegar. Poucos sabem da minha existência e isto pouco importa. Os que sabem me dizem coisas boas e boa mesmo é a vida, as cores, o tempo.

Retorno de uma cidade limpa, belíssima, quase impecavelmente arquitetada para encher os olhos e a vida dos seus habitantes. Poucos pedintes pela rua...poucos? Acaso um só não seria muito em qualquer lugar?

Parece que ainda estamos complacentes a uma lógica perversa.

Alguém comenta na jardineira*: "se tem coisa feia nesta cidade, eu não vi". Aponta-se, então, um barraco. É, desconfia-se que há gente a sofrer.

E sou salva por Leminski na sua pedreira curitibana:
Magna Santos

*tradicional ônibus turístico de Curitiba

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

REPUBLICAÇÃO DE ANIVERSÁRIO

É incrível como o tempo, este eterno conselheiro e juiz, tem corrido. Já se foram três anos de Sementeiras e nem ao menos atinei para o que isto significa. Tenho apenas desconfianças, devido a qualidade das palavras que colhi através dos comentários, dos contatos e encontros com tanta gente linda que tenho conhecido, através e a partir do Sementeiras. Por favor, sintam-se todos homenageados com a republicação desta crônica, a qual escrevi em 2008 me banhando em lágrimas, justo na hora do almoço; um verdadeiro vexame, eu diria, pois tive que me recompor rapidinho para poder trabalhar. As palavras nem sempre escolhem hora nem lugar para saírem dos dedos. E estas foram um abraço no meu único irmão - de sangue - com o qual tenho aprendido, desde que nasci...por tudo o que a gente já viveu nesta vida e, certamente, ainda vamos viver.
A todos vocês o meu muitíssimo obrigada por tudo.

Sem mais delongas, fiquem com Deus e com o:

SUPER-HERÓI DE BOTAS
Ontem o menino me mostrou um maço grande de canos de alumínio a serem mexidos e remexidos para virarem um varal. Não é suficiente o já pronto, o improvisado, o arranjado. Feliz ele se sente mesmo é em projetar, bolar, meter a mão na massa, do modo mais simples das pessoas de bem, que vêem nas próprias mãos fábricas inusitadas para suprirem necessidades pequenas ou grandes. Em vão as tentativas para demovê-lo da idéia, não há argumentos suficientes para lhe tirar este trabalho, que, desconfio, será um prazer. Quanto tenho aprendido com ele! Quanto ainda minhas mãos hesitam, vacilam...

As suas, ao contrário das minhas, desde cedo trabalharam, mas também brincaram, traquinaram. Bicicleta, cavalo, bola, latas, pedras, armadilhas, baladeira, carrinho de lata, bola de gude, desde cedo a atividade era grande. Mãos e pés ensaiavam o dinamismo constante que seria sua vida. E não parou mais. Canivete para as valentias, logo podadas pela mãe; treinos de um super-herói, que depois descobriu onde estavam as verdadeiras armas. Alguns ajustes para não perder o roteiro, o prumo, para também fortalecer o que, mais tarde, deveria estar mais forte. Assim, o colete para coluna e as botas ortopédicas lhe ajudaram a se manter firme, a pisar melhor.

Menino bom, que cedo inventou de pedir ao avião que passava: "avião, me manda um irmão!". Foi contrariado com a chegada de uma irmã, aprendendo que nem tudo vem conforme se pede. Também aprendeu a dor da despedida logo cedo, o que o fez engolir carboreto no lugar de bombons, fato incompreensível para a menina do avião que adorava uns confeitos, uns doces. Mesmo com tanta incompreensão, ele cedia aos pedidos dela e, de vez em quando, amarrava toalha no pescoço para voar melhor em busca de alguém em apuros. Era a dupla dinâmica a voar pela casa, pulando de cama, sofá, cadeira, salvando o mundo inteiro.

É, este é você. Não, você é muito mais do que isso. Teus pés caminham firmes esse tempo todo, embora o cansaço às vezes te visite. Sabes que não estás sozinho e isso é muito bom. Aos poucos tenho aprendido os valores que há tempos já compreendes. Desconfio que a menina do avião começa a aterissar. Espero caminhar ao teu lado qualquer dia desses e poder te ajudar nessa estrada. Por ora, apenas te ofereço o que posso te dar: o meu amor. Ainda te vejo com toalha nos ombros e hoje carregando consigo tantas preciosidades para meu coração.

Voa, voa alto!

Quando o varal estiver pronto, aproveita para estender a paz, a alegria e a esperança. Estaremos ao teu lado para apreciar a paisagem.

Que Deus te abençoe e te proteja sempre!


Magna Santos

sábado, 13 de agosto de 2011

GUGUI

Perguntei a ele sobre poesia
Respondeu
Sobre metafísica
Outra resposta
Endereço de bares, cafés, happy hour...
Forneceu
Teorizou
Ah, gugui, tu sabes demais!

Mas Puxinanã é um perigo perguntar ao Gugui
Complicado demais
Pai dos analfabetos virtuais
Ancestrais da ignorância
Tu não sabes de tudo, Gugui

Outro dia, digitei um poema inteiro para atinar onde estaria
Ele mexeu, remexeu
Nada respondeu.
Desconfio que ainda averigua

Só queria dizer, assim, simplesmente, que encontrar amigos nem sempre é conseguido
Às vezes é complicado
A gente também mexe, remexe e nada responde

Reconhecê-los?
Às vezes trava e a memória da obediência arrisca:
Melhor apelar aos antigos

Ontem, Gugui acertou
O riso venceu
O abraço vicejou
A emoção aflorou
A dúvida morreu

Num pedaço da Argentina, conhecemos
Quanto as palavras valem a pena
(Que nem é tanta pena assim)
Um bebe para a coragem chegar
Uma a cria no divã
Outra, na cidade, rodopia um dia inteiro
Outros, meramente, chegam

E assim se desenhou nossa noite
E se pintou de três cores:
A preta foi iluminada com lanternas e velas
A vermelha consumida com bebidas astrais
A branca...
Ah, a branca...
A branca foram dos papéis
E do branco do olho de cada um.


Especialmente, para meus queridíssimos Geó, Dimas, Fabiana e Valda.
Para Lena, Ducaldo e Edjane por nos aturar a alegria incontida, graças a Deus.



Magna Santos

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

DISTÂNCIA

Essa estrada toda pela frente
Deveria ter mais pontes no caminho
Mas se estende infinitamente
Como se não tivesse tamanho, sim
Dimensão
Quilômetros não se medem
Contam-se no tempo
Que acelera o que deveria demorar
E retarda o que o coração urge

O que sei é de ouvir falar
O que não vi é o que a imaginação comanda
Não quero ser apenas uma lembrança
Nem somente uma voz ao telefone


Magna Santos

terça-feira, 2 de agosto de 2011

PEQUENA ALEGRIA

Quarta fila do Teatro Guararapes. Primeira a querer saber sobre o show, segundo funcionário da bilheteria. Mal contive a alegria. Quarta fila. Gil estará lá, sem chance para o "ou não" costumeiro. Estará sim e eu também, se Deus quiser. Eu e minha turma. Geraldo Maia abrirá o espetáculo. Primo do meu amigo Domingos, também digno e ótimo de se escutar.

_ Magninha, Geraldo Maia abrirá o show! Vai ser perfeito.
_ Geraldo Maia?
_ Sim, ele é ótimo.
_ Sei quem é Geraldo. Ele estava dando uma palhinha na feijoada do Domingos, que te falei.
_ Não acredito!
_ Foi. Não se avexe não. Dia 13 você escutará os dois: Geraldo Maia e Gilberto Gil.

Depois do dockside, foi aberta a temporada para os pequenos sonhos. Desconfio que não somos apenas o que fazemos, mas também o que ouvimos, o que queremos ouvir. Foi a música, mais do que os livros, que me embalou desde pequena. Não aprendi um instrumento sequer, como já contei aqui, porém, desde pequena, ela vive sustentando todos os momentos. Saudade, medos, preconceitos, conceitos, Deus, festa, alegria, tristeza, raiva...sou capaz de cantarolar algo sobre cada coisa. Gil com sua Refazenda, despedindo-se de Drão, 'falando com Deus', 'matando a sede' num Domingo no Parque, são algumas das músicas, situações vividas. E, quando as coisas velhas teimavam em aprisionar, apesar do meu Lamento Sertanejo, a Novidade vinha me dizer o quanto valia a pena e eu voltava a Andar com Fé.

Ah, meus amigos, perdoem essa pieguice incontrolável. Sou mesmo uma criança com doce nas mãos ou uma apaixonada vendo o Luar. É só minha alegria. No dia 13 faremos uma Procissão para aquele desorganizado estacionamento do Centro de Convenções, com a velha ansiedade sobre o tempo que se escorre, porém, lembrarei do Tempo Rei e tudo ficará em Paz.


Fiquem com um pouco de Galeano (presente lindo de Boca que costuma frequentar este espaço). Talvez ele consiga dizer o que não pude aqui:

A função da arte/1

Diego não conhecia o mar. O pai, Santiago Kovadloff, levou-o para que
descobrisse o mar. Viajaram para o Sul. Ele, o mar, estava do outro lado das dunas
altas, esperando.

Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia,
depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos. E foi tanta a
imensidão do mar, e tanto seu fulgor, que o menino ficou mudo de beleza.

E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao
pai: — Me ajuda a olhar!
Eduardo Galeano


Magna Santos