domingo, 26 de julho de 2009

ARCO-IRIS DE PENAS*

Pintaram um arco-íris
De asas
Caído do céu
Ciscando ligeiro
Pelo terreiro
À procura de milho
Não
À procura de abrigo
Não
À procura
A'penas

Magna Santos

* Mais uma parceria com Pachelly Jamacaru, o qual entrou na brincadeira e autorizou a publicação desta fotografia.

domingo, 19 de julho de 2009

ÚLTIMA VEZ

Na última vez que te vi
Tinhas os olhos manchados
Havia névoa
Que inundava tua visão
Nela se confundindo
Como uma vidraça
Suja na manhã

Tanta dor em teu olhar...
Ceguei

Hoje não te vejo mais
Muito menos te sinto

Perguntam-me ainda por ti
Poucos que insistem em lembrar-te

Quando estão comigo
Respondo:
Não sei


O tempo passa, amigo
E apaga muitas marcas
O tempo passa, irmão
E nos permite novas estradas

As pegadas do caminho
Dão-me certeza:
Caminhei

Os rastros dos meus pés
Me convidam a novos andares

Teimo em ver o horizonte
Com olhos bons
Sem névoa
Sem manchas
Sem dores

...
Só paz.



Magna Santos

domingo, 12 de julho de 2009

PALAVRAS

As palavras não são minhas
Não são
As palavras são delas mesmas
Embora constrangidas
Por passarem por tantas mãos


As palavras secam
Quando não as pronuncio
As palavras reclamam
Quando não as acarinho


As palavras...
Sempre elas
A me acordarem

À noite para uma longa espera


Sim
As palavras têm insônia
Perambulam nas esquinas
Andam sozinhas nas ruas
Ou acompanhadas pensam
No final


No ponto final.



Magna Santos

quarta-feira, 8 de julho de 2009

RESQUÍCIOS DE VIAGEM E OUTRAS BOBAGENS

Há viagens que rendem. Esta rendeu. Salvo-conduto para andar em paz pelo resto do ano. Portanto, impagável.

No alto dos meus 39 anos, me vejo às vezes bem menina, embora noutras velha me pareço. Devo sofrer de um distúrbio ainda a ser catalogado. Se tiver sorte, entrarei pra história, quando conseguir decifrar meu próprio caso. Não, melhor passar a bola pra minha analista, talvez a oportunidade seja dela.

Nunca tive nenhum problema em relação ao passar do tempo, nenhum rasgo de vaidade ou sei lá o quê para esconder idade. O tempo passa e, para mim, isto sempre foi muito natural. Assim, vivi, estudei, por força do próprio trabalho, pesquisei, anos atrás, construindo hipótese confirmada, no final, sobre as temidas palavras que passeiam pelo caminho do envelhecimento. Associei à ideologia e Althusser me ajudou deveras nos meus pensamentos, além de Luria, o chato do Lacan e tantos camaradas que nos instigam a pensar melhor. Portanto, teoria não me faltava.

Porém, o que são teorias comparadas às vivências em família? Lá vai uma cena besta, banal, mas que me rendeu boas considerações: não sei mais o que estávamos a conversar, nem o que se passava na minha cabecinha chata para sair com esta pérola no meio dos meus iguais:

_ Eu achava que demorava tanto chegar os 40. Antigamente, pensava mesmo que uma pessoa de 40 anos tinha tanta idade! Hoje em dia os mais jovens não pensam assim.

Os olhos admirados da minha cunhada me interrogaram aos risos:
_ Como é? Antigamente? Não, minha filha, antigamente não, ainda hoje.

Surpreendentemente, a minha impressão era só minha. Ninguém concordou comigo. Mas será o Benedito? Meu sorriso amarelo não era pário pra risadagem que se formou, muito menos para inúmeros exemplos surgidos aos montes e de várias bocas ao mesmo tempo. Deus do céu, quase se formou um debate, tendo a mim como alvo, logicamente. Como não ía perder a diversão, teimei, reforcei o que nem eu mais acreditava só para ver a coisa pegar fogo. Eu gosto mesmo é do barulho.

A celeuma perdurou, mas amansou até no dia seguinte reacender em um ambiente onde os adolescentes dividiam o espaço conosco. Eles lá jogando o velho jogo de baralho chamado "burro" e nós cá, conversando miolo de pote. Um certo "nós cá" bem que tentou infiltrar-se no jogo, mas foi avisada pela outra: "te manda que tu és tia". Esta informação não podia dar noutra coisa, senão em mais risadas e teimas. Mas, por força das circunstâncias, renunciei a qualquer intuito de jogo. Enquanto conversava, retorcia a cabeça à mesma linha do ombro e observava com vigor a atividade "joguística".

_ Magna, tô avisando: tu tás doida para ficar com torcicolo. Olha pra cá, "tia".

E agora vocês podem perguntar onde isso tudo, afinal, foi parar. Em lugar algum, amigos. Bem, continuo com minhas teimas (pois gosto da graça), alguma teoria sem maior relevância (embora com mais uma palavra para computar: 'tia'. O torcicolo? Ah, já estou bem, obrigada, mas da pomada cataflam não restou quase nada.


Magna Santos

segunda-feira, 6 de julho de 2009

VOLTANDO

Vocês vêem coisas. Aqui não sou eu a escrever. Desconfio que não cheguei ainda. Ainda estou lá...onde não sei. Talvez me demore na porteira admirando o ipê que não floresceu. Quem sabe abraçada ao jasmim, plantado por mãos avós que não conheci. Devo estar numa rede contemplando o Araripe, buscando classificar suas cores tão singulares, tentando também imaginar as vidas naqueles pontinhos brancos que dizem serem casas distantes. Lá, por certo, não se precisa de geladeira nem de luz elétrica nem de gás. De que se precisa lá, meu Deus?

Lá, onde não sei, devo estar acompanhando uma criança alimentando pintos. Saudade também se sente das galinhas, mesmo que depois as coma e repita mais e mais e mais, como se iguaria e criatura fossem diferentes, como se aquela do prato fosse algo fabricado, bem distante da amiga do quintal.

Os sons ainda estão nos meus ouvidos. Acostumei-me aos plurais engolidos cheios de risadas e tudo mais. Reconhecer uma voz antiga, rir com outra aprendendo a falar. Rir também de tantas outras coisas...de perder o fôlego! Rir de si mesma, dos outros, da vida, das diferenças das gerações que nos acordam para o passar do tempo.

Ah, sensações!

Devo estar ainda cantando um "parabéns pra você" numa farra assim, digamos, bem "thriller", pois é necessário atualizar os acontecimentos.

Sim, é necessário atualizar-se. É essencial estar em dia com o coração para deixá-lo chorar de emoção ao ser convidada para madrinha de mais um amado pequeno com nome de avô. Quanta honra num convite, quanto isto representa!

É preciso estar aberta a conhecer gente nova, receber um presente cheio de poesia, trocar abraços e sorrir, mesmo sem jeito, com o convite para o compartilhamento de palavras. Outra honra.

Demoro-me demais nos cantos. Mas, creio, já peguei o ônibus, já tentei dormir no seu embalo, já me assustei com a chuva e o horário de retornar ao trabalho, quando aqui entrei nesta cidade de surpresas.

Cheguei, portanto, para outras viagens.


Magna Santos